Nos da Cha Yê! estamos em Jing Hong, uma cidade na província de Yunnan no extremo Sul da China. Tudo aqui é muito diferente do que nas regiões que visitamos ano passado em diversos aspectos. Há uma influencia maior dos vizinhos do sul como Tailândia e Laos, além da maioria da populaço ser formada por minorias étnicas (25 etnias, segundo o numero oficial) como os povos Yi, Bai, Hani, Zhuang, Dai and Miao, que juntos dão as formas da região. Nesse post falaremos um pouco sobre Yunnan e seu principal produto agrícola o chá Puer.

A busca por bons chás Pu’er envolve uma serie de fatores, mas talvez o mais importante seja o de encontrar uma região com boas e antigas (mais de 200 anos) arvores de chá. Assim Yunnan é a região perfeita, aqui nasceu a cultura do chá e nessas terras estão as mais antigas árvores cultivadas por humanos do mundo. Para encontrar essas arvores teríamos que entrar montanha adentro e explorar lugares onde poucos ou quase nenhum estrangeiro pisou.

Em Jing Hong conversando com Mark

No nosso primeiro dia em Jing Hong fomos ao encontro do Mark, grande entusiasta e conhecedor de chá. Mark é um inglês que em uma viajem a Tailândia acabou cruzando para Yunnan e por aqui se fixou. Ele se envolveu inevitavelmente com a cultura dos chás Pu’er e hoje é proprietário, em sociedade com um chinês de nome Ju Ge, de uma loja que vende chás super exclusivos (e caros) de Pu’er verde. Esses chás são vendidos prensados em um forma redonda, em formato de bolos, são os chamados “cakes”. Os cakes mais baratos de sua loja custam por volta de R$ 400 podendo chegar a mais de R$ 5000. O motivo? A origem do seu mao cha. O mao cha é o nome dado as folhas de chá depois de serem colhidas e secas nas okis de ferro (grandes bacias de ferro) e ao sol pelos pelas minorias étnicas que habitam as regiões onde as arvores anciãs de chá se encontram. As árvores que produzem os melhores e mais caros Mao chas são as mais velhas, acima de 300 anos no mínimo, para que após prensado o cake seja considerado lao shu cha (老树茶) – chá da arvore anciã. Em mercados e lojas nas cidades e vilarejos os comerciantes vendem diversos níveis de mao cha, mas pela experiência que tivemos no passado e pelo que o Mark nos ensinou, a chance de levar de fato o que está sendo anunciado é pequena. Por isso a importância de manter bom relacionamento com as famílias que vivem nessas montanhas e colhem os chás. Nosso amigo Mark faz isso como poucos, tendo inclusive um terreno na montanha Nan Nuo onde no ano passado ele construiu uma casa de processamento e armazenagem para que parte das folhas frescas que ele compra sejam processadas e transformadas em mao cha bem debaixo do seu nariz.

Caio e sua moto.

Ontem, dia 20, partimos para a primeira incursão na região de Meng Hai. Foi uma jornada incrível pelas montanhas que aqui são conhecidas como as ‘6 montanhas famosas’ por serem o berço da produção de chá do sul de Yunnan e possuírem plantações de centenas de anos onde os arbustos que estávamos acostumados a ver se tornaram verdadeiras arvores.

O Mark nos levou para conhecer as regiões de onde eles compram o seu Mao Chá e onde possuem relacionamento com algumas famílias locais. Para acompanharmos ele e sua moto alugamos duas motos e dois capacetes (por aqui não muito populares) e partimos cedinho para o campo. Subindo as montanhas nos deparamos com alguns colhedores, mas não muitos pois quase todo o chá já foi colhido. A partir de agora os arbustos ainda produzem duas “safrinhas” uma no final da primavera, chamada de segunda colhida, e possui qualidade inferior a da primeira, e uma terceira chamada de chá do verão que é colhida no final de julho e é um chá inferior e barato. Os bons chás Puer são exclusivamente da primeira colheita da primavera.

Apos subir por algumas horas de moto, as deixamos na casa de um camponês e seguimos caminhando floresta adentro. A primeira coisa que fica evidente é como as árvores de chá da região são antigas. Sabemos que a camélia sinensis tem um crescimento super lento, de aproximadamente 1mm por ano no diâmetro do tronco. Estávamos nos deparando com árvores de troncos que variavam de 20cm a 45cm, ou seja arvores de 200 a 450 anos de idade. Outra característica muito interessante é que diferente das regiões de Fujian e Zhejiang, aqui as arvores de chá estavam no meio da floresta. Podíamos perceber que elas haviam sido plantadas pois estavam espaçadas de forma uniforme e continua, mas a floresta a sua volta estava bem preservada e contribuía para a mágica do lugar.

No alto da montanha, nos abrigando da chuva com a acolhedora hospitalidade dos camponeses de Xishuangbanna.

O encantamento da garotada com os lao wais – “gringos”.

Ficamos quase o dia todo na floresta com o Mark apreciando a beleza dessas arvores. No caminho de volta passamos por alguns pequenos vilarejos onde o chá estava sendo processado em Okis de ferro e vimos quase que em todas as casas que cruzamos uma parte do telhado ou na lateral da casa um espaço reservado para a secagem ao sol das folhas de chá. Ainda no caminho de volta o céu escureceu e uma tempestade veio. Por sorte cruzamos com um conhecido do Mark, um camponês que colhia e processava chás que nos acolheu em seu lar e nos mostrou os chás que havia colhido e processado na primeira colheita da primavera. Era um chá bem interessante, ficamos apreciando o seu sabor e contemplando a Chuva que aumentava. Quando o anfitrião percebeu que a chuva não iria passar tão cedo e que provavelmente ficaríamos lá por mais tempo, falou algumas coisas em chinês para os seus familiares, e algumas crianças e num piscar de olhos todos estavam indo de um lado para o outro descendo pra horta e indo na vendinha da cidade. Perguntei a Mark o que estava rolando e ele disse que eles fariam um jantar para suas visitas. A sua residência era a mais simples possível, sem luz, sem pia, sem fogão. Apenas uma pequena fogueira no canto da sala, aonde sua esposa preparou uns 7 pratos diferentes que nos foram servidos. Um mais deliciosos que o outro e todos quentinhos.

 

Como fazer um banquete com uma única fonte de fogo?!